Esta é uma história sobre um pássaro que só encontrou prazer ao deixar de voar, um equilibrista que encontrou sua desgraça por nunca ter caído e sobre uma garota que aprendeu sobre o prazer, sobre a desgraça, sobre a vida e sobre a poesia.
Era o dia da partida do circo, mas havia um espetáculo extra, normalmente ele começaria às 20h, mas o sol ainda se espreguiçava, quando uma multidão se juntou para ver o equilibrista executando pela última vez o seu número. Era um fato conhecido que o número do equilibrista suscitava muitos suspiros do público, sua eloqüência era incrível, embora andasse com uma segurança tal qual a certeza que se tem de que algo jogado para cima eventualmente desce, conseguia convencer o público de que estava prestes a cair e das bocas cobertas pelas mãos ouvia-se os suspiros. Dessa vez, no entanto, não dava nenhum indício de que cairia, e as pessoas suspiravam lágrimas convulsivas. Os palhaços choravam e não havia uma maquiagem a ser borrada, porque era manhã, e no alto o equilibrista estava em sua corda habitual, pendendo pelo pescoço. E a garota, que viera contar ao equilibrista que o pássaro mais uma vez poderia voar, e contar aquilo que ele não percebera, contar do seu sorriso, contar do seu amor e de como o teria em seus bra... a garota nada pode fazer, senão se juntar à suspiração coletiva. E ela o fez.
E ela o fez, se juntou a suspiração coletiva, quando o equilibrista subiu na corda. Ele andava com uma segurança tal qual a certeza que se tem de que algo jogado para cima eventualmente desce, mas conseguia convencê-la de que estava prestes a cair e dos braços estendidos em direção ao equilibrista ouvia-se os suspiros. E ele, ao ver os braços estendidos suspirou para si. E ao acabar o seu número convidou a garota para passear, andou equilibrando-se nos meio-fios, bancos, em tudo o que havia para se equilibrar e, no entanto, o sorriso da garota o desequilibrava. Ele por muitas vezes fingiu a queda, mas conquistara a confiança da garota e essa não mais lhe estendeu os braços, apenas sorrisos. O equilibrista subiu em uma árvore, queria que a garota lhe estendesse os braços, mas tudo o que ela fez foi cobrir a boca, quando ele lhe mostrou o pássaro que havia encontrado abandonado e machucado na árvore. A garota levou o pássaro para casa e passou a dedicar a ele o seu afeto todos os dias.
E todos os dias dedicou a ele o seu afeto, sorriu os sorrisos, sorriu as palavras que não disse, sorriu os braços que não estendeu, e sorriu o amor que sentiu. O equilibrista se desequilibrava com o sorriso apenas como sorriso, se ao menos soubesse de todos os outros afetos disfarçados de sorriso, teria ele com certeza ido ao chão antes de executar o seu último número. A garota sorria também a consciência de que a corda era o mundo do equilibrista, que ele a deixaria para ir arrancar os suspiros de garotas outras e passear com elas, e se equilibrar nos meio-fios e bancos delas, e não o culpava, nada é culpa de ninguém, afinal, as coisas apenas acontecem. E aconteceria do equilibrista ir embora. E ela acontecia de estar sofrendo, sorria também o sofrimento, que era para não desequilibrar o equilibrista que zelava por ela. Ela esperaria por ele, quando ele voltasse na próxima temporada talvez pudesse compreender o seus sorrisos.
Quando voltasse na próxima temporada, talvez ele pudesse compreender os seus sorrisos, então ela esperaria por ele. E decidiu não lhe contar nada sobre o equilibrista, porque o seu sofrimento poderia causar vertigens. Como poderia o pássaro voar, se sentisse vertigem. Ela sorriu então a consciência de que o céu era o mundo do pássaro e que ele havia de voar, talvez, até o seu último número. E estendeus as mãos para que o pássaro pudesse voar. Ele não voou.
Talvez o céu fosse o mundo do pássaro porque não havia ninguém para lhe receber de braços estendidos no chão.
Leialti minimalista.
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Um comentário:
que coisa, yuyu!
espero que nao precise de legenda novamente.
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